Há algum tempo que queria fazer o tradicional caminho do peregrino que parte de Lisboa e vai até Fátima. Depois da data típica do peregrino, e de vários amigos meus terem ido fazer o caminho de bicicleta, comentei no trabalho que gostava de experimentar fazer o caminho, visto já ter percorrido imensos sítios de bicicleta, e um caminho tão tradicional como o de Fátima nunca ter feito. Foi aí que entrou o João Maria, não era tarde nem era cedo, marcámos logo provisoriamente a data de 16 de Junho para ir fazer a nossa voltinha de bicicleta e convidámos vários amigos que se quisessem juntar a nós para um dia de ciclo-turismo até Fátima. Acabámos por juntar um grupo de 5 ciclistas, nós os 2, o Romão que eu não conhecia e era amigo do Maria, o Faneca com quem já tinha feito alguns passeios destes e o Gonçalo, o filho do Faneca.
A primeira parte da nossa jornada foi acessível, já conhecia o caminho porque é coincidente com o de Santiago de Compostela, apesar de algumas pequenas alterações devido a melhoramentos nos trilhos, novos passadiços, etc, e foi bastante divertido recordar a passagem por aquele caminho. Chegada a Valada e a primeira paragem para a bifana. Nessa altura estava a começar a sentir dores nas costas o que me preocupou, ainda estávamos a meio do caminho e a parte mais complicada ainda estava para vir. Até Santarém até se geriu bem o desconforto, depois daquela paragem de 1 hora em Valada as costas estavam mais aliviadas. Em Santarém a paragem já foi um bocadinho mais rápida e seguimos caminho para enfrentar a parte mais dura do caminho.
Um pouco mais à frente parámos à entrada de um estradão onde está um senhor com um barracão dedicado aos peregrinos, ainda estivemos lá algum tempo à conversa e a tirar umas fotos. A partir daqui foi a doer, tive de apear a primeira vez numa subida íngreme onde me fugiu a roda da frente por ir numa mudança leve, e depois devido à inclinação não consegui voltar a montar até um ponto em que a subida aliviava um bocadinho. A próxima paragem foi no Arneiro das Milhariças, estavam lá as festinhas da terra e estivemos outra vez mais de 1 hora a comer e a beber. As minhas costas estavam cada vez pior, já começava a não ter posição em cima da bicicleta, e o grupo tinha de diminuir a velocidade para eu os conseguir acompanhar, e segundo eles ainda faltavam subidas bem duras.
Até os Olhos de Água houve mais uma subida complicada mas que consegui passar. Aí fizemos uma paragem rápida para o café e preparar para entrar na Serra d'Aire, agora sim ia doer. A primeira subida consegui fazer com alguma dificuldade sem ter de apear, muito dura mesmo ainda por cima já com mais de 110 kms nas pernas. Na subida a seguir a Monsanto tive de apear, aí por falta de força, foi a primeira vez que me comecei a sentir realmente cansado, além das dores de costas estava a começar a sentir alguma fadiga, apesar de ter comido bem e hidratado bem ao longo do dia, com aquele imenso calor e esforço acumulado as pernas estavam a começar a não querer responder.
A meio da subida antes de Minde, já em alcatrão tive de pedir ao grupo para parar, há muito tempo que não me sentia assim, senti-me totalmente esgotado, sem forças e a precisar de um saco de soro directamente na veia. A coisa não estava mesmo nada fácil, já me doía tudo, o corpo não queria responder e só pedia para que as subidas parassem, não ia desistir de maneira nenhuma apesar de todo o meu corpo dizer para eu parar. Ao fim de 5-10 minutos deitado no chão de pernas para o ar lá arrancamos novamente e devagar. Como a subida era em alcatrão, calmamente lá chegámos ao topo e consegui recuperar o ritmo cardíaco, respirar normalmente e concentrar-me para a descida que aí vinha. A descida foi das partes mais divertidas do percurso, larguei-me estrada abaixo e cheguei aos 70km/h, finalmente estava a voltar a divertir-me.
Em Minde nova paragem um bocadinho mais demorada, beber um batido de morango que soube como se tivesse sido o melhor do mundo e um pão com chouriço. A subida que faltava estava a preocupar-me, estavam a dizer que era bastante difícil e eu não estava em grande condição física. Contudo só tive de apear uma vez em toda a subida e foi numa zona algo técnica e inclinada que noutras condições até passava, mas antes que caísse preferi seguir um bocadinho a pé. O fim da subida parecia não acabar, as eólicas que assinalavam o fim da subida pareciam estar mesmo ali mas nunca mais lá chegava. A seguir à subida era simples até Fátima, voltámos a aumentar a média para mais de 20km/h e foi bastante rápido até Fátima. A chegada ao cair da noite foi espectacular, fui poucas vezes a Fátima, mas sem dúvida que esta foi a melhor, o cair do sol atrás da catedral deu uma paisagem belíssima. Sofri como há muito não sofria, mas voltava a fazê-lo, obrigado aos meus excepcionais companheiros de viagem pela paciência que tiveram comigo, foi uma viagem memorável.
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