segunda-feira, julho 28, 2014

Ultra Atlântica

Para mim o dia começou bem cedo, tinha de estar em Setúbal para apanhar o ferry às 5h45m, por isso eram 3h45m e estava eu a levantar-me da cama. Devo dizer que estava com imenso receio desta prova, seria a distância mais longa que alguma vez tinha corrido, e ainda por cima sempre em areia. A prova arrancou de Melides às 9h, tempo ameno, sem vento, e a areia mole como tudo que enterrávamos os pés e tornozelos, mesmo alguém leve como eu.

Achei curioso as diferentes estratégias a nível de equipamento, houve quem corresse descalço, só com meias, com ténis, uns com camelback, outros com garrafas à cintura, um pouco para todos os gostos, eu corri de ténis e camelback, acho que para mim é a forma que mais se adapta. Os primeiros 15kms foram feitos a um óptimo ritmo, fui sempre com um outro atleta que tinha conhecido no início da prova, ajudou a passar o tempo e a esquecer o cansaço. Aos 15kms iamos com 1h42m de prova, um tempo excelente dada a dureza do percurso. Nessa altura desci um pouco o ritmo, as pernas estavam a ficar cansadas e ainda faltava muito.

Daí e até os 20km mantive o meu companheiro de corrida a uma distância ainda alcançável, aos 20km passei com 2h26m, estava a quebrar ligeiramente mas o tempo ainda era bastante bom. Aos 21km apanho o meu colega outra vez, seguimos juntos uns minutos até que tive de parar a primeira vez para tirar a areia de dentro dos ténis. Nessa altura já me sentia muito débil e pensei que não ia conseguir terminar a prova, ainda estava a meio e as pernas não respondiam. Até os 28,5kms passámos umas quantas vezes um pelo outro, ora eu ultrapassava-o ora ele me ultrapassava e aos 28,5kms devia de ir mesmo com 3-5min de vantagem. Nessa altura era o único abastecimento que tínhamos, estava com cerca de 4 horas de prova e sentei-me na areia para por as coisas na mochila, comer e beber algo. E depois para me levantar...não conseguia, rebolava para a esquerda e não tinha força para me levantar, rebolava para a direita e a mesma coisa. Entrei em conflito comigo próprio, abandono a prova ou não, estava em sofrimento atroz, mas já tinha sofrido tanto que não queria desperdiçar esse esforço, tinha as virilhas e as entre pernas todas assadas devido à água com sal, estava mesmo em agonia.

Lá fui desencantar forças não sei bem onde, levantei-me a cambalear e segui a andar. Essa foi a pior fase da prova, estava tão cansado que ia caindo uma meia dúzia de vezes, qualquer pequena ondulação parecia uma maré gigante a fazer-me rasteiras aos pés. Nessa altura já muitos atletas começavam a andar e das coisas mais desmotivantes que já senti até hoje era ver alguém a andar à minha frente, e eu num ligeiro passo de corrida não conseguir encurtar distância, o que significava que estar a andar ou a correr aquela velocidade era a mesma coisa. Por volta dos 34kms voltei a parar para tirar a areia dos ténis, estava tão cansado e os quilómetros pareciam não passar, nesta altura já sentia que não estava numa prova de atletismo mas sim numa prova de sobrevivência.

A seguir à placa dos 37,5km era a única altura que a areia estava minimamente boa para correr, os pés já quase não enterravam e já não estávamos todos tortos porque ali o areal era direito. Ainda consegui correr aceitavelmente durante uns 3kms até ficar sem energia. A partir daí foi a andar e a correr a trote até à meta, no final já com muito apoio inclusivamente de outros atletas. Quando olho para o relógio na meta marcava 6h59m, um pequeno "sprint" final dentro das minhas capacidades para acabar abaixo das 7h, eram 6h59m40s quando cortei a meta e tombar de esgotamento 1 metro a seguir. Os meus colegas vieram logo ver como estava e um elemento da organização com uma garrafa de água, só queria era respirar e já respondia a tudo o que quisessem. Sofri como nunca mas acabei, numa prova onde desistiu imensa gente, onde ouvi comentários como - "Este ano foi o pior nunca tínhamos apanhado areia tão mole!"- ou -"Estou farto de fazer trails de mais de 60kms e nunca me senti tão mal como hoje". Bem, mission accomplished, ainda não há classificações mas o mais importante está feito, acabei!!!


segunda-feira, julho 14, 2014

Como criar uma empresa?

Há cerca de 2 meses estive no processo de criação da minha empresa, e apesar dos simplex e da redução das burocracias, o processo continua a não ser linear e continua a levantar algumas dúvidas. Vou deixar aqui um pequeno guião, não oficial, mas que representa a experiência que tive.
  1. Falar com vários TOCs (Técnico Oficial de Contas), existe uma pequena variação de preços entre eles, mas quanto a mim deve ser escolhido aquele que nos dá mais garantias de satisfação, o TOC deve ser visto como o nosso 'simplificador de vida' a partir do momento em que a empresa é criada.
  2. Escolher o nome da empresa, pode parecer algo simples, mas o meu conselho é escolher uns 3-5 nomes porque quando se for fazer o registo os critérios para aprovação de nome são algo chatinhos.
  3. Entretanto começar a ver bancos e as condições que cada um oferece, após o registo da empresa temos 5 dias úteis para associar a empresa a uma conta bancária.
  4. Falar com seguradoras pois é necessário ter um seguro de acidentes de trabalho, nem que seja uma unipessoal é necessário o sócio-gerente ter seguro.
  5. Criação da empresa em si, existem neste momento 2 formas:
    1. Deslocando-se a um IRN (Instituto dos Registos e do Notariado) e de preferência um que tenha uma conservatória no mesmo espaço de modo a que a aprovação do nome seja imediata. Esta foi a opção que tomei, apesar de ser mais cara saímos do IRN já com tudo tratado e sem mais preocupações deste tipo.
    2. A segunda opção não foi a que utilizei mas também me parece simples, é o registo online através do Portal da Empresa. A parte que normalmente pode ser mais complicada para quem não é informático, é a necessidade de ter um leitor de cartões para ler o cartão do cidadão e depois é necessário ter um software de assinatura digital de pdf, existem vários gratuitos como por exemplo o ePaperSign, é possível ver como se faz a assinatura neste vídeo. Para fazer a criação online existe este guião que é só seguir e torna as coisas muito mais simples.
  6. Finalmente depois de registar a empresa há o prazo legal de 15 dias para dar a abertura da actividade na segurança social. Esta abertura de actividade deverá ser feita no início do mês pois se for feita por exemplo a dia 25 ainda é necessário pagar segurança social nesse mês, logo é melhor dar início de actividade no princípio do mês para não se desperdiçar dinheiro. Neste processo o TOC já poderá auxiliar, como tudo o restante daqui para a frente.
  7. Escolher um software de facturação que exporte ficheiros SAF-T PT que são necessários para as finanças, existem vários gratuitos, eu por exemplo estou a utilizar o weoInvoice, e para pequenas e médias empresas é mais que suficiente, mas mais uma vez o TOC será uma ajuda preciosa neste aspecto.

segunda-feira, julho 07, 2014

Triatlo de Caminha

Nunca tinha experimentado o triatlo longo e para quem só faz triatlos há 1 ano achei que era um risco ir fazer um triatlo longo, ainda por cima o de Caminha que para quem conhece é um dos triatlos mais duros do país, mas lá me deixei convencer pelos meus colegas de equipa.

Arrancámos para Caminha no sábado às 6 da manhã, 450km e 5h30m depois lá chegámos a Caminha, o tempo totalmente fechado de chuva e eu a começar logo a dizer mal da minha vida. Queríamos ir fazer o reconhecimento de parte do percurso mas nem isso estava fácil, sempre a chover. Lá para as 16h30m lá houve uma aberta, agarrámos nas bicicletas e fomos fazer os quilómetros iniciais onde estão algumas das rampas mais agressivas. Quando acabamos a primeira rampa de 2-3 quilómetros e com percentagem média acima dos 10%, com rampas superiores a 20%, pergunto-me a mim mesmo: "Eu amanhã vou ter de passar 2 vezes por aqui e já com desgaste acumulado...estou desgraçado, como vou fazer isto?". Voltamos para casa e vamos fazer o reconhecimento da corrida, fomos correr para uma parte de pinhal com um pouco de areia solta, não era muito duro, mas também não era alcatrão.

À noite fomos jantar juntamente com os outros atletas num jantar promovido pela organização, uma atitude de tirar o chapéu à organização, oferecer o jantar a todos os atletas que quisessem e promover o convívio muito boa iniciativa, ainda para mais o jantar estava bem servido e a pensar em quem ia fazer um esforço significativo no dia seguinte. Durante a noite, por volta das 5 da manhã acordo com a chuva a bater violentamente na janela, mais uma vez começo a dizer mal da vida, a chuva iria tornar as descidas de bicicleta muito mais perigosas além do frio que iríamos ter por estarmos molhados.

Quando me levanto às 6h30m já a chuva tinha passado, não sabia nessa altura mas íamos ter sorte com o tempo, acabou por não chover, só caiu um pequeno borraço no topo da serra durante a primeira volta do segmento de ciclismo, e o tempo manteve-se enublado quase até ao fim do ciclismo, ou seja acabou por estar uma temperatura ideal para quem fazia um esforço físico e sem chuva durante toda a prova.

A prova começou já eram quase 9h, a organização esteve bem mais uma vez, este ano o segmento de natação foi feito a favor da corrente, a prova já é dura o suficiente para termos de nadar contra a corrente como foi o ano passado. A ida de ferry até à partida no meio do rio também é giro, vamos ali todos na amena cavaqueira a trocar experiências enquanto o nervosinho miudinho começa a aparecer. Com a corrente a favor escusado será dizer que parecíamos foguetes na água, queria fazer um tempo abaixo dos 35 minutos neste segmento e acabei por fazer 29m30s, sem grande esforço e fazendo certamente mais de 2 quilómetros em vez dos 1,9 quilómetros que era suposto fazer em linha recta. Acabei por ser o 70º neste segmento ali no meio do pelotão como é habitual no segmento de natação.

Preparar para a tortura, o segmento de bicicleta, esperar ter a sorte de não ter nenhuma avaria nem nenhuma queda visto que as descidas eram algo perigosas e eu gosto de descer rápido. Ao final das 2 primeiras grandes subidas passa por mim o meu colega João Santos, não consegui ir com ele mas mantive-o sempre em linha de vista, as rampas duras não deixavam criar grandes distanciamentos. Quando começaram as descidas mais técnicas apanhei-o e passei por ele. A parte final de cada volta era um pequeno sobe e desce constante, nessa altura eu e o João mantivemos-nos juntos de modo a psicologicamente ser mais fácil.

No início da segunda volta na parte das rampas mais agressivas perdi o João de vista, senti que tinha de controlar o ritmo porque as coças estavam a ficar pesadas. No final das rampas mais agressivas pensei para mim que o pior já estava, o problema é que estava muito mais desgastado do que na primeira volta, e rampas curtas mas agressivas que na primeira volta fazia com a potência do embalo agora a coisa já não era bem assim. Nesta altura ainda me juntei a um atleta do Alhandra e fomos puxando um pelo outro e trocando umas palavras como maneira de esquecer o sofrimento. Quando faltava 15-20 quilómetros para o final e começa novamente aquele pequeno sobe e desce constante nessa altura foi quando me senti pior ao longo de toda a prova, as pernas já não respondiam, doía-me as lombares e as dorsais, e além disso tinha ficado sem a companhia do atleta do Alhandra passaram por mim uma meia dúzia de atletas. No final desse sobe e desce aproveitei para parar 1 minuto para a minha 2ª paragem por motivos fisiológicos e ao mesmo tempo conseguir respirar que o segmento da bicicleta estava quase a acabar e o pior já tinha passado, mas agora tinha de "dar o litro" na corrida.


Acabei o segmento de ciclismo ligeiramente abaixo das 4 horas que era o meu objectivo, apesar disso fui só o 118º na bicicleta e estava com a sensação que não tinha mais ninguém atrás de mim, que era mesmo o último. Estava agora com sensivelmente 4h30m de prova, queria apanhar pelo menos 1 atleta na corrida para garantir que não ficava em último, mas não via ninguém quando saí do parque de transições. As sensações eram boas, estava a correr bem e abaixo do meu objectivo que era 5min/km. Quando entro no pinhal que era uma parte mais dura começo a passar atletas, rapidamente passo 4, já não ia ser último. Nessa altura passa em sentido contrário o Carlos Sá que estava a fazer em estafeta, no final ainda acabei por trocar umas palavras com ele, um simples "Parabéns pela prova!", mas deu para perceber a humildade de um dos melhores atletas nacionais e um dos nossos porta estandarte.

Voltando ao segmento de atletismo, entro na parte mais dura que nem estava contar com ela, muita areia solta, muitas pedras, ao bom estilo de uma corrida de trail, e aí sozinho e sem referências a minha média começou a baixar um pouco, apesar de me continuar a sentir bem mas não tinha o estimulo de ter alguém à frente ou atrás. Após esses troços mais duros começo a avistar atletas claramente debilitados, alguns a andar inclusivamente, entro em modo predador, apanho um, e mais um, e mais um...acabei inclusivamente por ultrapassar o João Santos que o tinha perdido no início da segunda volta do ciclismo e o atleta do Alhandra que tinha feito parte da segunda volta do ciclismo comigo. Durante o segmento de atletismo apanhei 15 atletas, o que vamos ver acaba por não ser anormal, tenho um ciclismo muito fraco e saiu tarde, como o meu atletismo é forte, acabo por estar junto a atletas com menos disponibilidade física, torna-se fácil ganhar lugares.


No final acabei o atletismo com uma média pouco superior ao que queria, mas em boas condições físicas, sentia que se tivesse de correr  mais 10kms corria e ainda ia apanhar mais meia dúzia de atletas. Acabei por ser o 70º no segmento de atletismo tal e qual como fui na natação, o que normalmente acontece a minha posição na natação é idêntica à da corrida, acabando com 6h20m de prova no lugar 101º da classificação geral. Super contente por ter acabado inteiro o meu primeiro Half Iron Man, assim como pelos meus companheiros de equipa, todos nós os 6 acabámos, sendo 4 de nós estreantes nesta distância, apenas o Nelson teve uma pequena queda na bicicleta que lhe deixou uma mão esfolada, mas sobreviveu e acabou a prova. Uma palavra de agradecimento à organização, bons abastecimentos (tirando depois de cortar a meta que não havia nada de substancial para comer), simpatia, prova lindíssima a nível de ambiente natural, bom esforço para que tudo corresse bem. Fica aqui a foto dos estreantes no final da prova para a posteridade com o Nuno Santos, o Nelson Moreira, eu e o Ricardo Costa.


quinta-feira, julho 03, 2014

Economia paralela

Desde que criei a minha empresa tenho tido um cuidado extra no que toca a pedir facturas, se já tinha o hábito de pedir agora é pré-requisito que me passem factura. O que tenho notado é que tirando as grandes superfícies e grandes eventos que não conseguem fugir ao fisco, ninguém tem vontade de passar factura e quando pedimos ainda somos olhados como criminosos.

Restaurantes, estadias em apartamentos, inscrição em provas desportivas e em muito mais situações as respostas típicas são: "Nós não passamos factura.", "Se quiser factura não é este o valor", "Ou paga a conta toda a dinheiro ou não lhe posso passar uma factura total", ou pior do que isso nem obtemos resposta quando fazemos a pergunta.

Por isso é que todos nós depois somos sobrecarregados de impostos, se a evasão fiscal não fosse tão grande todos nós pagaríamos menos impostos e o valor dos serviços e produtos seria mais baixo, enquanto assim continuarmos a maioria vai continuar a pagar mais, para uma minoria que continua a fugir aos impostos, mas a culpa é de todos nós que compactuamos com esta situação, e contra mim também falo, enquanto formos coniventes os criminosos somos nós e os outros é que se andam a rir às nossas custas.