A etapa do segundo dia, apesar de não ser a maior a nível de distância, seria aquela que era mais complicada devido à altimetria, e não sabia eu, a nível de dificuldade do terreno. Começámos um bocadinho mais tarde do que eu queria, estivemos à espera que o café abrisse às 8h30m para comer o pequeno almoço. Se calhar sou eu que estou mal habituado, mas não me cabe na cabeça que um café abra tão tarde. Em conversa, nessa altura sugeri que nesse dia almoçassemos na Zambujeira do Mar que era mais ou menos a meio do percurso que nos levaria à Arrifana, ou se a coisa estivesse a correr mal, num restaurante que conhecia em Almograve.
A etapa começou de maneira agradável junto às arribas frente à Ilha do Pessegueiro, nem sempre era fácil transpôr os obstáculos e o terreno arenoso, mas a beleza da paisagem fazia esquecer o esforço. Sim os primeiros 5 kms foram feitos de um modo lento, mas o pior estava para vir, os segundos 5 kms todas as vezes que fiz o Tróia-Sagres fiz pela praia, à beira mar, porque apanhei sempre a maré vazia. Desta vez a maré estava cheia e tivémos de subir para as dunas, e passámos mal, quase 1h30m para fazer 5 míseros quilómetros, quase sempre a arrastar a bicicleta pela areia pois o terreno de ciclável não tinha nada. Uma das imagens fortes desta viagem foi o Hugo aos murros no guiadouro, a vociferar, totalmente frustrado e cansado. Esta seria a única coisa que teria mudado em todo o percurso, nesta zona ou se consegue ir pela praia com a maré vazia ou o melhor é ir até ao alcatrão e evitar as dunas.
Chegámos a Vila Nova de Mil Fontes por volta do meio dia e ainda nem tínhamos feito 20kms, antevia-se um dia muito complicado, mais ainda do que tinha prespectivado inicialmente. Sugeri que seguissemos caminho apesar de já ser meio dia porque se tudo corresse normalmente estaríamos em Almograve passado 1 hora e almoçávamos por lá. Assim foi, chegados a Almograve procurei o restaurante que conhecia, lembrava-me que era junto a uma rotunda, que tinha ideia que ficava no caminho, mas não encontrei. Então fomos comer ao Snack Bar Sol e Mar, que revelou-se uma excelente escolha, comida boa, sobremesa gigante e preço pequeno. Seguindo viagem, logo de seguida percebi porque não encontrei o restaurante. Na verdade não estavamos ainda em Almograve, estavamos na Longueira, e quando cheguei a Almograve percebi o meu erro.
Estavamos a chegar à parte do percurso que mais gosto, a ligação entre o Cabo Sardão e a Zambujeira do Mar. Quando chegámos à Zambujeira do Mar já eram 16h30m e ainda faltavam mais de 45 kms, devo confessar que estava a ficar um pouco apreensivo. Seguimos em direcção a Brejão, num percurso que nunca tinha feito e me tinha sido indicado pelo Borja. Nessa altura cruzámos-nos por um casar já com alguma idade que também viajava de bicicleta. Demorámos algum tempo a conseguir ultrapassá-los e só o fizemos durante uma descida, eu pensei - "Bolas, estão mesmo em forma, a dar aqui um baile aos putos!" - depois de uma subida um pouco ingreme fiquei à espera do pessoal e nisto lá vêm os velhotes outra vez, tinham ultrapassado o resto do grupo, quase que fiquei de boca aberta. Nisto quando passam por mim oiço um barulhino de um motor, olho para o quadro e vejo a bateria, pronto isso explicava muita coisa.
Quando chegamos a Brejão reparo que o Hugo está no limites das forças, com uma péssima cara e comecei a pensar que se calhar não íamos conseguir chegar à Arrifana. Mais de 35 kms para o fim e já eram 17h30m, se calhar devia mesmo ter levado luzes, algo que nunca pensei acontecer antes de começar esta viagem. O percurso que se seguiu ainda bem que era super simples e belo, o que deu para o Hugo recuperar. Começámos a seguir sempre pelos canais de água até chegarmos a Odeceixe.
Chegados à ponte de Odeceixe perguntei se queriam seguir pela estrada nacional que tinha um percurso mais curto, mas a inclinação era muito superior, ou seguir o trajecto inicial que era ir em direcção à praia de Odeceixe, cujo o percurso era mais longo mas a inclinação era substancialmente inferior. A decisão foi seguir em direcção à praia. Apesar da inclinação ser inferior ela estava lá e o Hugo sofreu para chegar lá acima. Confesso que nesta altura já não estava a desfrutar muito do dia, estava mais procupado com o Hugo e com o sacrifício que ele estava a fazer. Sei muito bem o que é estar no estado em que ele estava, e a força mental que é necessária para continuar a seguir em frente. São estas alturas em que estamos fisicamente mais debilitados que acabamos por perder a concentração, o que pode levar a erros e a quedas. De qualquer maneira eu conhecia a topologia do terreno até Aljezur e sabia que o pior já tinha passado e que a partir dali era sempre a descer.
Realmente até Aljezur foi seguir novamente os canais num percurso super simples, sem qualquer dificuldade e algumas descidas super divertidas, mas que não podiam ser encaradas com displicência porque tinham alguma perigosidade. Chegados a Aljezur somos presenteados com uma subida imponente até ao Castelo de Aljezur. Como íamos dormir à Arrifana ainda tínhamos de subir mais do que esperava, não conhecia essa parte do trajecto porque sempre tinha ficado a dormir em Aljezur e nunca tinha passado pela Arrifana. Para dificultar as coisas o Hugo estava com 2 furos lentos o que nos obrigava a ir parando para pôr algum ar nos pneus. Já era tarde e estavamos a menos de 10 kms da Arrifana, por isso não queríamos estar a perder tempo e energia a mudar os 2 pneus. Ainda sugeri ao Hugo que eu e o Maria o empurrássemos até ao final mas ele quase a rosnar rejeitou a ajuda. Chegámos à Pousada da Juventude da Arrifana já passava das 20h30m. Nota 20 para as pessoas da pousada, super simpáticas e ajudaram em tudo o que podiam, inclusivamente disponibilizaram a cozinha para nós na manhã seguinte, pois íamos sair antes da hora do pequeno almoço.
O último desafio do dia foi encontrar um sítio para jantar, todos os restaurantes fechavam às 21h...21h...verdade? Ainda por cima numa altura do ano onde já há imensos turistas e pessoas de férias, não percebo, cafés a abrir às 8h30m, restaurantes a fechar às 21h, há pessoas que nem querem trabalhar para o próprio negócio. Eu e o Fábio, como já tínhamos tomado banho nem esperámos pelo Hugo e o Maria, e fomos à procura de um sítio para jantar. Depois de termos batido com o nariz na porta no restaurante Brisamar, por já ter a cozinha encerrada, fomos até Sea You Surf Café, e em boa hora o fizemos. Apesar de já ser quase 22h, que era a hora que a cozinha encerrava, disponibilizaram-se logo, arranjaram uma mesa e deixaram-nos à vontade. Ainda por cima a comida era bastante boa, e foi uma óptima maneira de terminar um dia complicadíssimo.
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